sexta-feira, 13 de maio de 2011

13 anos depois...

Na década de 70, quando a família Feio de Lemos morava na Rua Júlio Verne, o Mário Feio decidiu que  a vida de marido, de pai de família e de viajante não exatamente era aquilo com o que ele havia sonhado desde "rapazote" (como ele diria). O fato é que ele se cansou de toda essa rotina enfadonha e, numa manhã do inverno, acordou, levou a filha menor, Cristina, ao Colégio Júlio Grau, para mais um dia no jardim de infância e seguiu para trabalhar.
E nunca mais voltou.
Nem para buscar suas roupas, nem para visitar os filhos, sequer para contar a sua versão da história.
Lembrando do Marcus e do seu jeito sisudo como pai, dá para imaginar o estrago que essa atitude fez na personalidade dele.
Aquele pai amigo, que inventava grandes empreitadas em construir minuciosamente as pandorgas, nas noites de verão, que assava um ou outro churrasco com a maior lentidão desse mundo e que enchia o prato de pimenta a cada refeição, se foi.
Não era uma viagem, das muitas que ele fez em toda a vida da família Feio de Lemos. Não era uma ausência pequena, nem um até logo. Foi um adeus, só que sem nenhuma despedida.
Num certo momento, quando o Marcus conversava comigo (na empresa que ele comandava, a SPASSO - essa é outra história), nos idos de 1991, comentou que foi essa a maior indignação dele com o Mário: o fato muito simples de ele não ter tido o cuidado de olhar na direção dele (filho) e ver o quanto isso afetaria a vida de um menino de 11 anos...
Não foi sem antes deixar a única e decisiva marca que nos perseguiu (a nós, os filhos do casal) durante anos. Numa discussão com a Lena, no calor do momento, entre muitos dos argumentos que ela tentava usar para dissuadí-lo de abandonar a família, ela perguntou: "Mas Mário, e as crianças?" e ele respondeu indignado "Bota num orfanato!".

Esse foi um dos - poucos - detalhes acerca do casamento de tantos anos que a Maria Helena contou para nós, ou para mim, pelo menos.
E esse é o relato da dolorosa separação do casal que se casou de modo tão pomposo em 1964.
Logicamente que a Vera deve saber muuuuuito mais, mas, por fidelidade,  nunca nos contou.
A Sônia também deve saber mais. Todos souberam muito tempo depois.

A necessidade já havia entrado na casa da família, a fome e a falta de emprego - e de salário -  vinham assombrando o casal há meses (anos talvez, eu nunca soube).
Os aluguéis da bela casa de dois quartos na Júlio Verne, com pátio, 2 cachorros e com vizinha nos fundos, estava atrasado há mais de 6 meses.
 E dessa forma, com muita vergonha da situação de separada, a Maria Helena ganhou o mundo a procurar emprego, depois de mais de 12 anos sem trabalhar fora de casa.

Foi, saiu a pé. A pé e de chinelos de dedo da marca Havaianas (seu único calçado). Passou a sair todas as manhãs a procurar um sustento para os filhos e para colocar, como ela dizia anos depois "pelo menos um grão de arroz nas latas".
Sem roupas novas para melhorar a apresentação, carregando o peso de não contar toda a verdade a quem ela se apresentava, encontrou um modo de se sustentar. Primeiro, conseguiu umas "escritas contábeis" para fazer em casa, depois na Metalúrigca Aço Técnica (na Av. Polônia) e, depois, na Lideroil do Brasil Ltda. (primeiro na 7 de abril, depois na fábrica de Gravataí e na Santos Dumont, em Porto Alegre).

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