domingo, 12 de fevereiro de 2012

A visita do Alexandre e a Indústria Farmacêutica

Nesse blog, vamos contar detalhadamente o grande salto profissional que foi a visita do Alexandre Ribeiro de Azevedo na nossa casa, numa noite fria de 1982.

Ele vinha trazendo na pasta a melhor notícia que o Marcus havia recebido até então: a de abertura de vagas para recrutamento na empresa da indústria farmacêutica que viria a mudar a vida dele a partir daquele momento.
O Alexandre era nosso primo, filho da Joan Ribeiro e grande amigo de todos nós, seguia a carreira do pai. Frequentava nossa casa e já demonstrava, naquele período, como se podia viver bem com um salário melhor.

Lembro que ele chegou empolgado, conversando com o Marcus sobre todos os detalhes da entrevista e de como seria importante isso e aquilo...
Alguns dias após, dentro do terno recém comprado à prestação nas Lojas Renner para a ocasião, e também dentro da única camisa, única gravata e único par de sapatos, o Marcus se apresentou para a entrevista de emprego no Laboratório Aché.

Como todas as coisas na vida do Marcus, não foi nada fácil. Na primeira entrevista, ele recebeu um folheto de propaganda de produtos da empresa, contendo cerca de 08 (oito) páginas, frente e verso, e a incumbência de decorar todo o texto até a próxima entrevista, agendada para dali a três ou quatro dias. Parece que havia um final de semana no meio e ele deveria se apresentar nas primeiras horas da segunda ou da terça.

Jamais esquecerei o que se passou a partir daí: o Marcus mal dormia, mal comia, não assistia tv e não saía de casa, passou a repetir para si mesmo, em voz alta, cada palavra do folheto, religiosamente, até que TUDO, TUDO MESMO estivesse absolutamente decorado e na ponta da língua.
Nenhuma de nós, nem eu nem a Lena fomos poupadas de pegar o papel e tomar dele muitas vezes cada trecho.
E, da forma mais impressionante, ele sabia, ao final do primeiro dia, cada pedacinho do que estava escrito naquele folder. As palavras em latim, nomes complicados de produtos farmacêuticos e substâncias ativas de medicamentos, reagentes, indicações, tudo. Ele sabia quando se abriria uma chave, um colchete, um parênteses.

Movido pela necessidade e pela determinação de conseguir a vaga, o Marcus nos emocionou a todos. Na verdade, me emociona até hoje lembrar daquele guri de 17 anos, quase fazendo 18, que se vestia de abrigo e tênis surrado... Ele se arrumava para ir trabalhar como auxiliar de escritório e vender lanche na empresa para aumentar uns trocados na nossa parca renda, se atirou de cabeça na oportunidade que apareceu.

O resultado foi que aquele momento foi um divisor de águas na vida dele. Os gerentes ficaram bastante impressionados com o desempenho dele e a vaga foi conquistada com todo o esforço possível!

A partir dali, ponto de encontro todos os dias, às 8(oito) horas da manhã, defronte ao Hospital de Cardiologia, na Avenida Princesa Isabel e ponto de encontro também à tarde agendado todos os dias pelo supervisor.
A partir dali passaram a chegar caixas e caixas da transportadora direto na nossa casa, as quais continham milhares de amostras para distribuição para os médicos(as), clínicas, hospitais.
A partir dali, era possível ver todos os dias o esforço pessoal do Marcus em modificar o temperamento e o gênio, sempre recluso e fechado, tornando-se um falante representante do Laboratório Aché.

E, para complementar, todas as noites era verificado pela Lena o terno e a calça do traje, todas as noites era lavada e passada a única camisa, para que no dia seguinte ele pudesse estar de novo impecável para se apresentar no novo emprego e diante dos médicos.
Foi assim até a chegada do primeiro salário, quando, finalmente, a grana deu para comprar mais algumas camisas e um colete... afinal, era inverno!