quinta-feira, 16 de junho de 2011

O preço da bicicleta

Marcus e a bicicleta

Todo mundo que conviveu com o Marcus sabe que ele torcia pelo Grêmio. Sim, como está descrito no perfil, ele era Gremista, e fanático.
Sem precisar ir a jogos ou andar fardado, mas, acima de tudo, ele não gostava do Inter. Não do “Internacional”, e sim do Colorado e de colorados. Isso mais do que tudo.
Por essa razão, fica difícil a todos os amigos e amigas imaginarem que ele um dia foi colorado. Foi convencido e praticou essa arte durante algum tempo. Abanou bandeira, foi ao Beira-Rio e tomou refresco colorido vendido no campo em garrafinha de plástico (dessa eu sou testemunha ocular).

A história do “lado colorado do Marcus” é simples e fez parte da formação da personalidade dele.
Tudo começou quando ele, e a irmã, eram pequenos, e por influência do pai.
Até agora já contamos (neste blog) que o Mário Feio, movido pela paixão e por algo mais, se tocou de lá de Fortaleza para conhecer a Lena e que o resto de suas vidas passaram aqui no Sul.
Em consequencia desse gesto e das condições em que vivíamos, jamais tivemos contato com a família (ou com a história) do nosso pai., salvo raríssimas exceções, de uma visita nossa lá e de umas visitas de uns tios aqui e acolá.

E, como não poderia deixar de ser, o Marcus nasceu e cresceu um Feio de Lemos entre Pinheiros e se tornou mais Pinheiro do que ele próprio imaginava. Por essa e por outras razões, era torcedor gremista como a maior parte dos homens da família, embora o culto ao futebol fosse bem menor na época da infância dele.
Cabe lembrar que essa nossa história se passa no início da década de 70 e que foram anos duros para o Grêmio Foot-Ball Portoalegrense. O Inter, ou melhor, o Colorado ganhava todas, ano após ano. Se essas vitórias, uma trás da outra, especialmente sobre o Grêmio, eram uma desolação para qualquer gremista, também fez crescer uma legião de colorados e de novos colorados. Foi assim que o Mário Feio, Pai do Marcus, veio para o RS e se tornou torcedor do Colorado. Foi assim, também, que ele veio com toda a sorte de propostas e ofertas para que os filhos se tornassem colorados também.
Com a irmã não foi nada difícil, já nasceu colorada e nem sabia a diferença, na verdade (pobrezinha).
Teve até uma vez em que ela esteve frente a frente com o Figueroa e – epa essa é outra história...

Voltando a vaca fria... o pai do Marcus – e o Inter, com as suas vitórias - vinham fechando o cerco em torno da ideia de virar colorado (isso é possível??? hehehe, brincadeirinha). Até que o Marcus, acho que ali pelos 6 ou 7 anos, quis uma bicicleta.
A vida naqueles tempos não era muito fácil e as bicicletas eram presentes bastante especiais. Dignos de serem ofertadas em datas mais especiais ainda, como nos dias do Natal ou do aniversário. E custava caro. Mesmo.
Para uma criança dos anos 70, no Brasil, ganhar presentes era raro e a gente tinha de passar por algumas coisas como a fase um: pedir o presente, fase dois: convencer os pais da necessidade do presente ser aquele mesmo (ainda mais tão caro como esse) e pela incrível fase três: esperar, esperar e esperar (quase) uma eternidade até chegar essa data em que fosse possível ganhar o presente.
Como vocês já adivinharam, num dado momento, o pai do Marcus acabou aceitando dar a ele a bicicleta que ele tanto sonhava. Só que, em troca, o Marcus teria de ficar colorado, só que a parte de ficar colorado vinha imediatamente.
O novo colorado tinha de provar que o coração tinha ficado vermelho para então mostrar ao pai que fazia jus ao presente que lhe fora prometido.

O Marcus, por fim, viveu a sua fase de torcedor colorado. Vestiu camiseta e comemorou os gols. Juntos visitamos o Beira-Rio para uma partida do Inter contra não-sei-quem, num distante domingo dos primeiros anos daquela era vermelha.
Convencido, e feliz, o Mário Feio atendeu ao pedido, isto é, deu a bicicleta ao filho. O Marcus ganhou de presente a sua Monark, ou melhor, uma Monaretta “dobramatic” vermelha.
Pelo sorriso na foto, dá para perceber que é sobre essa bicicleta dos sonhos que ele está apoiando o braço.
O final da história é mais simples do que o começo: realizado com o presente e sem precisar mais agradar o pai para atingir o objetivo, o Marcus deixou de ser colorado e voltou a ser gremista, de imediato, sem nenhum peso na consciência pelo artifício.
Dali a alguns anos, conseguiu até mesmo ajuda para pintar a bicicleta e colocou, de uma vez por todas, bem longe de si a cor vermelha. Para sempre.

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